A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) divulgou um estudo nesta quinta-feira (12) que revela um aumento médio anual de 60% nos processos judiciais contra companhias aéreas no Brasil desde 2020.
Com base em dados fornecidos por uma empresa especializada em análise de ações judiciais, a Abear identificou que cerca de 10% dos aproximadamente 400 mil processos em curso foram movidos por apenas 20 advogados ou escritórios de advocacia. Isso sugere a existência de um esquema de litigância predatória que eleva os custos operacionais das empresas, prejudica a concorrência e aumenta o preço das passagens, impactando negativamente os usuários do transporte aéreo.
A Abear estima que as companhias aéreas brasileiras gastam cerca de R$ 1 bilhão por ano com despesas judiciais. Esse valor é em parte atribuído ao fato de que, em média, elas pagam cerca de R$ 6.700 em indenizações a cada pessoa que a Justiça considera ter sofrido danos morais devido ao serviço prestado ou não prestado pela empresa.
“Os dados que estamos apresentando hoje são preocupantes e refletem um cenário alarmante para o setor aéreo brasileiro,” afirmou a presidente da Abear, Jurema Monteiro, pedindo uma “abordagem integrada” para enfrentar o problema.
De acordo com a Abear, o suposto esquema de litigância predatória envolve plataformas conhecidas como “plataformas abutres”, que utilizam sites e redes sociais para identificar não apenas pessoas afetadas por atrasos, cancelamentos ou alterações de voos, mas também passageiros que, segundo a associação, não enfrentaram problemas durante a viagem.
Esses casos são então encaminhados a advogados parceiros que movem ações judiciais em nome dos consumidores alegadamente lesados. O objetivo dessas plataformas e advogados seria negociar acordos rapidamente e, em muitos casos, devolver o direito de comercializar as passagens obtidas judicialmente a agentes do setor de turismo.
“Isso não é uma consequência natural de problemas operacionais, mas sim o resultado de um esquema complexo envolvendo diversos atores, desde advogados até empresas de tecnologia e influenciadores digitais,” acrescentou Jurema.
Ela destacou que 98,5% das ações judiciais contra companhias aéreas são movidas no Brasil, um número que a Abear considera desproporcional, especialmente considerando que, de acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), 85% dos voos programados no ano passado aterrissaram no horário previsto e apenas 3% foram cancelados.
A Abear acredita que o “excesso de judicialização” no setor aéreo nacional resulta de uma combinação de fatores, incluindo interpretações judiciais que não consideram a legislação específica do setor e uma “cultura de busca por compensações judiciais”.
A entidade sugere que, além de uma maior articulação com o Poder Judiciário, é crucial “educar os consumidores” sobre procedimentos corretos e alternativas de mediação eficazes e menos onerosas para a reivindicação de seus direitos, bem como fortalecer os canais de atendimento das empresas para resolver rapidamente as reclamações.
A análise da Abear está em linha com os comentários do diretor-presidente substituto da Anac, Tiago Pereira, que, em 28 de agosto, afirmou que o volume de processos movidos por consumidores insatisfeitos contribui para o aumento dos preços das passagens no Brasil.
“O excesso de judicialização é uma das causas do alto custo da aviação civil no Brasil,” declarou Pereira durante um seminário onde a agência regulamentadora e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) assinaram um acordo de cooperação técnica para reduzir a judicialização no setor aéreo e evitar que queixas dos consumidores se transformem em processos judiciais.
Em entrevista à Agência Brasil, o diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Vitor Hugo do Amaral, reconheceu o aumento da judicialização, mas observou que, muitas vezes, os consumidores recorrem à Justiça porque as companhias aéreas não oferecem soluções satisfatórias para problemas como atrasos, cancelamentos ou extravios de bagagem.
“O consumidor ao comprar uma passagem deseja viajar no horário marcado, com segurança, chegar ao destino no tempo estipulado e receber sua bagagem. Não acreditamos que ele adquira o bilhete com a intenção de ajuizar uma ação. Se houver algum problema ou dano, ele geralmente procura a empresa aérea primeiro. Se a resolução administrativa não for satisfatória, é justo que o consumidor possa ajuizar uma ação. O Poder Judiciário então decidirá se houve violação de direitos,” afirmou Vitor Hugo, ressaltando que tanto a judicialização quanto o aumento dos preços das passagens são influenciados por múltiplos fatores.
“É necessário debater amplamente a judicialização no setor aéreo, sem condená-la previamente, e também evitar penalizar os consumidores que buscam reparação. A discussão deve focar na ampliação dos canais de comunicação e atendimento ao consumidor,” concluiu o diretor.
A Agência Brasil está aguardando um posicionamento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sobre o estudo apresentado pela Abear.
Fonte:agenciabrasil