O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, nesta terça-feira (24), que os países estão interconectados em relação às mudanças climáticas e que a Terra “está cansada” de acordos não executados. Ao abrir o debate com líderes de Estado na 79ª Assembleia Geral da ONU, em Nova York, Lula declarou que o Brasil não tolerará crimes ambientais e se comprometeu a eliminar o desmatamento ilegal até 2030.
“O planeta não pode mais esperar para cobrar da próxima geração e está cansado de promessas climáticas não cumpridas. Está exausto de metas de redução de emissões de carbono negligenciadas e de assistência financeira que não chega aos países em desenvolvimento. O negacionismo não resiste às evidências do aquecimento global”, disse, mencionando desastres como furacões no Caribe, tufões na Ásia, secas e inundações na África, chuvas intensas na Europa e as enchentes no Rio Grande do Sul, no Brasil.
Lula acredita que o multilateralismo, que pressupõe soberania igualitária entre as nações, é o único caminho para superar a urgência climática. Ele destacou que o Brasil se apresenta como “um celeiro de oportunidades neste mundo transformado pela transição energética”, com iniciativas em energias limpas e renováveis.
“É hora de encarar o debate sobre a lentidão na descarbonização do planeta e trabalhar por uma economia menos dependente de combustíveis fósseis”, enfatizou.
O presidente também mencionou que a Amazônia enfrenta a pior seca em 45 anos e que os incêndios florestais consumiram 5 milhões de hectares em agosto. “Meu governo não delega responsabilidades nem abdica de sua soberania”, afirmou.
“Além de enfrentar a crise climática, lutamos contra aqueles que lucram com a degradação ambiental. Não aceitaremos crimes ambientais, garimpo ilegal e o crime organizado. Reduzimos o desmatamento na Amazônia em 50% no último ano e pretendemos erradicá-lo até 2030”, prometeu.
Ele ressaltou a necessidade de ouvir povos indígenas e comunidades tradicionais ao buscar soluções para as florestas tropicais, além de explorar o potencial da bioeconomia. O Brasil sediará a COP 30, conferência da ONU sobre mudanças climáticas, em 2025, e, segundo Lula, o governo anunciará os compromissos do país neste assunto ainda este ano.
O discurso de Lula na ONU reflete os temas prioritários do Brasil no G20: combate às desigualdades, à fome, e enfrentamento das mudanças climáticas. Até novembro, o Brasil preside o bloco que inclui 19 países e duas entidades regionais – União Europeia e União Africana.
Pobreza e Desigualdade Lula reafirmou que a dívida externa dos países mais pobres deve ser resolvida e que instituições como o Banco Mundial e o FMI precisam oferecer uma representação mais justa para os países em desenvolvimento. A presidência brasileira no G20 enfatiza a cooperação internacional para criar padrões mínimos de tributação global, como a taxação dos ultra-ricos.
“As condições para acesso a recursos financeiros são proibitivas para a maioria dos países de baixa e média renda. O peso da dívida limita a capacidade fiscal de investir em saúde e educação, além de enfrentar a mudança climática. Na África, os empréstimos têm taxas até 8 vezes maiores que na Alemanha e 4 vezes maiores que nos EUA. É um Plano Marshall ao contrário, onde os mais pobres financiam os mais ricos”, destacou Lula.
Ele também alertou sobre a situação alarmante da insegurança alimentar, com 9% da população mundial (733 milhões de pessoas) subnutridas, e sobre o aumento da fome devido a pandemias, conflitos e subsídios agrícolas dos países ricos. Lula reiterou que combater a fome é uma escolha política e que é necessário criar condições para o acesso a alimentos.
No G20, o Brasil propõe uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que será lançada oficialmente na cúpula de líderes no Rio de Janeiro em novembro, mas já está aberta à adesão de todos os países.
Lula também fez um apelo especial para a América Latina, onde a combinação de baixo crescimento econômico e altas desigualdades gera “efeitos prejudiciais sobre a política”. “Tragada por disputas externas, nossa vocação de cooperação e entendimento se fragiliza”, disse.
Ele também coordenou o evento “Em defesa da democracia, combatendo os extremismos”, junto ao presidente espanhol Pedro Sanchez, visando fortalecer instituições no combate à desigualdade e à desinformação.
“A democracia deve atender às legítimas aspirações de quem não aceita mais a fome, a desigualdade e a violência. No mundo globalizado, não faz sentido recorrer a isolacionistas e falsos patriotas”, lamentou.
Lula propôs uma governança global para a inteligência artificial, visando que seus benefícios sejam compartilhados e promovam a diversidade cultural. “Estamos vivendo a concentração de poder em um pequeno grupo de pessoas e empresas. Buscamos uma inteligência artificial que respeite os direitos humanos e seja uma ferramenta para a paz, não para a guerra”, afirmou.
Conflitos Armados Durante seu discurso, Lula também defendeu a reforma da ONU para lidar com os desafios atuais, citando o aumento dos gastos militares, que atingiram US$ 2,4 trilhões pelo nono ano consecutivo. “Esses recursos poderiam ter sido usados para combater a fome e as mudanças climáticas”, lembrou.
Lula abordou conflitos como os do Sudão e do Iémen, e destacou a guerra da Rússia na Ucrânia e a crise humanitária na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Ao iniciar seu discurso, saudou a delegação palestina, que participou pela primeira vez como membro observador, e reconheceu o presidente da Autoridade Palestina, Mahmmoud Abbas.
Ele expressou tristeza pela falta de perspectivas de paz na Ucrânia e mencionou a proposta construída com a China para promover o diálogo entre russos e ucranianos.
“Ao que tudo indica, nenhuma das partes alcançará todos os seus objetivos pela via militar. Precisamos criar condições para retomar o diálogo”, concluiu.
A Assembleia Geral da ONU, que reúne 193 estados membros, tem como tema deste ano “não deixar ninguém para trás: agir em conjunto para o avanço da paz, do desenvolvimento sustentável e da dignidade humana”. Esta é a nona vez que Lula abre o debate geral.
O presidente chegou a Nova York no sábado (21) e, no domingo (22), participou de uma cúpula paralela à Assembleia. Ele reiterou que o Pacto para o Futuro aponta uma direção, mas é necessário mais “ambição e ousadia” para que a ONU cumpra seu papel.
fonte:agenciabrasil